Subiu lentamente os degraus empoeirados. O corrimão dourado, finamente trabalhado, trazia entre seus entalhes delicadas teias tecidas por aranhas que reinavam por ali há muito tempo.
A vastidão do salão que observava do alto da escada lhe tirava o fôlego. O silêncio quase absoluto, a escuridão parcial que dava aos móveis uma aura tão dramática, tudo a fascinava. As pratarias, as porcelanas, os quadros... Ninguém ousara tirar uma só agulha do lugar. E tudo parecia estar suspenso, intocado.
Caminhou pelo corredor, tantas portas! Altas, majestosas. Sabia exatamente qual delas deveria abrir.
Com o coração acelerado, fervendo de excitação girou a maçaneta fechando os olhos. Sentiu o cheiro, almiscarado. Abriu os olhos já marejados e, então, o viu. Sorriu enquanto chorava. Cobriu a boca com uma das mãos tentando, em vão, conter os soluços. E ele a olhava, terno, sapiente. Tão lindo! Deus, tão lindo. Ela não sabia que felicidade podia doer tanto. Como seu peito apertava, o ar lhe faltava. As pernas tremiam enquanto ela se aproximava dele, que a esperava.
Chegou perto o suficiente para, finalmente, tocá-lo. Aqueles olhos que ela conhecia tão bem, aquela boca que ela tanto beijara sem nunca ter sentido o seu gosto.
Acariciou o rosto amado com tanta delicadeza, tanta ternura. Tanto cuidado.
Ficou por muito tempo ali, à sua frente. Sorvendo cada detalhe daqueles traços tão harmoniosos, perfeitos. Deitou-se, então, na bela cama tão fria. Extasiada, adormeceu docemente emprestando seu calor às cobertas de seda.
E ele, que a observava tão sereno, eternizado em seu autorretrato há quase um século, sabia que sua espera, por fim, acabara.
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