O compromisso mais importante do
seu dia era pôr o lixo para fora.
Escolhia, com esmero, a camisa
mais bem passada. Lustrava os sapatos, ajeitava a gravata borboleta até estar
satisfeito com sua perfeita horizontalidade.
Alinhava os cabelos até que nenhum
fio mais ousado se rebelasse.
Conferia a própria imagem no
espelho diversas vezes, de todos os ângulos possíveis.
Finalmente, botava suas luvas de
borracha, pegava seu único saco de lixo muito bem amarrado.
Fazia questão de esperar o
caminhão de coleta no portão de sua casa impecável.
Ereto e com uma expressão
impassível, sempre esperava que o coletor viesse ao seu encontro. Então jogava
o saco de lixo aos seus pés e o olhava de cima a baixo, com um quase
imperceptível sorriso de escárnio.
Destilava superioridade por todos
os poros e se esforçava, de forma hercúlea, para demonstrar, apenas por seu
olhar, todo o desprezo que fosse capaz de sentir.
Voltava, então, triunfante para o
seu castelo.
Sentava-se à mesa, prévia e perfeitamente,
posta. E começava seu desjejum.
E mastigava suas torradas
perfeitas olhando para uma parede branca, de azulejos limpíssimos, frios.
E, como sempre, todos os dias, se
fundia à simetria perfeita dos quadradinhos enquanto um vazio brutal o consumia
e o devorava até não sobrar sequer resquício do prazer fugaz de que desfrutara
minutos atrás.
No outro quarteirão, dois jovens
pendurados no caminhão de lixo conversavam, animados, sobre o jogo do último
domingo. E combinavam o próximo churrasco entre amigos.
Nenhum deles reparou na
gravatinha.
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